Sexualidade Feminina e Doença Crónica
Atendendo ao crescente número de mulheres que vivem diariamente com doenças crónicas, a prestação de cuidados que visem minorar os danos colaterais provocadas pelas mesmas e pelos tratamentos realizados, constitui, uma prioridade interventiva que objectiva a promoção da sua qualidade de vida.
Como tal, tendo em consideração que estamos perante uma população-alvo que apresenta uma taxa de incidência de disfunção sexual que ronda os 20 -100% (dependendo da patologia, da área corporal afetada e dos tratamentos realizados) englobando quadros de desejo sexual hipoativo, dispareunia (dor genital, sentida durante o ato sexual), dificuldades de lubrificação e perturbações orgásmicas, é fundamental que os profissionais de saúde sejam sensíveis ao sofrimento latente no discurso da paciente e/ou do(a) seu(ua) parceiro(a) sexual de modo a proceder ao seu pronto encaminhamento para os serviços de especialidade.
Partindo do principio que o “amor” são duas solidões protegendo-se uma à outra” (Rainer Rilk), a intervenção psicossexual deve ter como prioridade major a promoção de um diálogo aberto e dinâmico que permita ventilar as necessidades e as limitações sexuais de cada elemento que compõe a díade, potencializando a reintegração dos contactos íntimos de carácter não sexual (que se vão perdendo à medida que a frequência sexual propende), porque ao contrário do sexo masculino, em que o desejo tende a gerar amor, no sexo feminino, é muito mais comum que seja o amor a gerar desejo. Por outras palavras, é fundamental que a mulher se sinta amada, independentemente da sua performance sexual para que ultrapasse os seus medos latentes de rejeição e se liberte de todos os pensamentos que a impedem de disfrutar plenamente da sua sexualidade, porque efectivamente, só existimos verdadeiramente durante os efémeros momentos em que não pensamos.
Paralelamente a esta realidade é importante:
1) promover o tratamento das perturbações psicológicas que possam subsistir,
2) trabalhar a imagem corporal e a auto-estima da paciente (tantas vezes lesada pelos efeitos secundários dos tratamentos), acreditando que é possível mudar uma pessoa, mudando a consciência que esta tem de si mesma;
3) gerir ativamente os sentimentos de culpa, banindo todos os mecanismos de auto-condenação que oferecem à paciente uma protecção mental ilusória por acreditar que quando se condena já mais ninguém tem o direito de o fazer, o que como é evidente, está longe de corresponder à verdade;
4) promover a vivência do presente, uma vez que a sexualidade só pode ser plenamente vivenciada no “aqui e agora” que é o único momento temporal que nos aproxima da ilusória e tão desejada eternidade, fazendo com que o amor possa, efectivamente, ser eterno enquanto dure;
5) desmitificar mitos e falsas crenças que tendem a transformar a sexualidade das doentes numa actividade recheada de imposições e limitações que condicionam a sua capacidade de encontrar na felicidade do outro a sua própria felicidade.
Contudo, para além das determinantes interventivas anteriormente alvitradas é fundamental, ter-se sempre bem presente, que a experiência do prazer no universo feminino é tão diversificada que pode ser perfeitamente satisfatória sem a presença do orgasmo, sendo perfeitamente possível adaptarmos o seu funcionamento sexual aos condicionalismos existentes (impostos pela cronicidade do doença) e ás características do(a) seu(ua) parceiro(a) afectivo(a), porque como diz Álvaro de Campos “Somos o intervalo entre o nosso desejo e aquilo que os desejos dos outros fazem de nós”.
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